terça-feira, 1 de abril de 2008

Por uma Educação

não-autoritária


Debatedores da Idec 2007 falam sobre a cultura escolar opressora e o que significa educar para a autonomia.

Meire Cavalcante


Com o tema “Auto-regulação: notas para uma pedagogia não-autoritária”, o educador Ricardo Casco, do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária, de São Paulo, iniciou sua fala sobre a homogeneização do atendimento escolar. Sua pesquisa permeia o campo da autoridade do professor na escola. Para ele, existe uma dupla hierarquia: a oficial, que está ligada a avaliações, notas e desempenho excelentes; e a não-oficial, mais relacionada com a lei do mais forte, ou seja, do lugar para a virilidade e a força física dos indivíduos.Nesse contexto, em que a estrutura de notas e classificações dá ao professor a condição de controlador e endossa sua autoridade, não existe espaço para o fraco e o inadequado. “A má adaptação, nesse caso, deve ser repelida, como o caso da criança que tropeça antes de fazer o gol, do inábil, do incapaz”, analisa. Para ele, esse olhar do professor, que ocupa um papel central e determinante, sobre seus alunos legitima a competição entre os pares, comportamento considerado natural na escola.Sob os olhos do mestreRicardo também explorou muito em sua apresentação a relação que se dá entre os alunos e como a escola a influencia. “A opinião do professor em ralação a uma criança pode determinar como serão as relações dela com seus pares.”, afirma. Ele explica que os alunos avaliam-se entre si usando os mesmos critérios que os professores usam. “Se a avaliação do docente, portanto, é negativa em relação ao aluno, muito provável que os pares o vejam da mesma maneira, o que pode influenciar em respostas inadequadas na vida adulta”, relaciona.Ele afirma, ainda, que crianças que sofrem violência na família podem reproduzir isso no ambiente escolar. “Mas há que se tomar cuidado com isso, pois esse fato não pode ser usado para culpar a vítima, ou seja, para dizer que a criança não aprende porque sua família não tem estrutura”, diz Casco.Para proporcionar um ambiente melhor ao desenvolvimento humano, o educador sugere que o trabalho pedagógico seja mais centrado nos alunos e na cooperação entre todos. Para ele, escolas que privilegiam isso apresentam menos agressividade, o que propicia mais oportunidades de aprendizado, inclusive. “Os professores podem fazer uma troca: em vez de privilegiar apenas os resultados, valorizar o processo.”Auto-regulação: dentro de cada umO educador Leonardo José Jerber, da Universidade Federal de Minas Gerais, também falou ao público sobre sua vivência como professor da escola de aplicação da instituição. Para ele, é possível fazer educação democrática mesmo quando se trabalha numa escola não-democrática. “Certa vez, a diretora de uma escola onde trabalhei viu a minha turma, em pleno horário de aula, espalhada em pequenos grupos, realizando as mais distintas atividades. Para ela, aquilo era uma verdadeira indisciplina. Na cabeça dela, aula de Educação Física significa trinta alunos juntos, fazendo a mesma coisa sob o olhar do professor”, relata. Jerber confessa que não foi fácil convencê-la. Na verdade, ele não a convenceu, mas conseguiu permissão, ao menos, para continuar o trabalho.“A aula é viva. Mesmo que o professor a planeje, ela ocorre aqui e agora”, afirma. Isso remete à fala no domingo da professora da Universidade de São Paulo, Cecília Hanna Mate. Ela disse: “Do jeito que a escola se organiza, não existe espaço para o imponderável, o imprevisto. São 50 minutos, de uma disciplina tal, e pronto”, afirma.Segundo os estudos de Jerber sobre auto-regulação, cada pessoa tem em si a capacidade de reconhecer os próprios interesses. Para ele, promover autonomia à pessoa é promover a felicidade de existir, de poder se expressar, de entrar em contato consigo mesma e com o outro. “A educação autoritária produz neuroses, ensina a pessoa a não pensar por si e, de tão rígida, não vê o ser humano no todo”, critica. Para ele, quando se democratiza a educação, ela proporciona mais cooperação espontânea entre os alunos e, consequentemente, menos indisciplina.Segundo Jerber, a auto-regulação é quando a pessoa consegue reconhecer suas necessidades. “Vocês, que estão na platéia enquanto eu falo. Cada um terá uma forma de perceber do que precisa para se manter aqui, nesse local. Uns se movem na cadeira. Outros bocejam ou se espreguiçam. Se cansados, querem levantar e tomar uma água. Aprender a reconhecer essas necessidades sobre si é algo que deve ser preservado desde cedo”, afirma. Quando isso acontece, Jerber explica que a pessoa pode ter percepções, sensações e movimentos (tão valorizados na Educação Infantil, mas que se perdem conforme a criança cresce). “Tudo isso também serve ao docente. Como ele pode estimular o aluno a saber de si se ele mesmo não faz isso?”Jerber diz que o docente pode observar dois aspectos em seus alunos: 1) eles são capazes de agir com base em suas motivações?; 2) Conseguem expressar seus interesses? Para ele, isso pode determinar o vínculo entre professor e aluno. “E isso não significa falta de limites, mas sim a eliminação de limites agressivos, violentos e desrespeitosos, que causam rigidez de pensamentos e de movimentos nos alunos”, diz.Ele afirma que, para trabalhar a auto-regulação com jovens que não tenham vivido esse tipo de experiência desde cedo, é preciso primeiramente realizar a hetero-regulação, ou seja, o professor guia as atividades previamente acordadas com o grupo e, se um aluno não se dispõe a fazê-las, conversa separadamente para descobrir o porquê. O passo seguinte é a auto-regulação, em que a criança e o jovem podem definir em conjunto com o docente o espaço, o tempo e os materiais a serem usados em cada atividade. “Ao darmos essa abertura, tenham certeza, descobriremos coisas incríveis que eles podem criar e realizar. Eu vivo isso diariamente.”Quando questionado sobre a inviabilidade de mudar a escola como é hoje para um modelo mais libertário, ele diz: “Não tenho pretensão nenhuma de convencer as pessoas a fazer o que eu faço. Simplesmente conto minhas experiências. Com isso, quem se interessa naturalmente se aproxima e eu convido quem quiser a visitar a escola, assistir às minhas aulas”, diz.publicação original: http://revistaescola.abril.com.br/online/cobertura/cobertura_250848.shtml

http://www.politeia.org.br/tiki-index.php?page=Por+uma+Educa%C3%A7%C3%A3o+n%C3%A3o-autorit%C3%A1ria

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