sábado, 15 de março de 2008

Tendler e as

respostas de

Milton Santos

à globalização

15 de Agosto de 2007

O documentário "Encontro com Milton Santos ou: O Mundo Global Visto do Lado de Cá", dirigido por Silvio Tendler, com estréia prevista para o dia 17, retrata um dos principais intelectuais brasileiros e aponta a necessidade de uma outra globalização.
Neto de escravos e filho de professores, Milton Santos (1926-2001) foi alfabetizado em casa pelos pais. Formado em direito, jornalista de profissão, foi para a França em 1958 quando se tornou doutor em geografia. Publicou 40 livros e assinou centenas de artigos. Morou e lecionou na França, Tanzânia, Venezuela, Estados Unidos e Canadá. Em 1978 voltou ao Brasil e na década de 90 se tornou uma das principais referências contra o neoliberalismo.
No documentário, Milton Santos, que se intitula o “intelectual outsider”, por não responde por partidos nem grupos acadêmicos, explica que a informação é o coração da globalização. É através dos sistemas de comunicação que as grandes empresas estabelecem atualmente seus domínios. Mas é também através da comunicação que pode se dar a mudança rumo a um futuro mais humano.
O filme, que aborda a globalização sob uma perspectiva periférica, tem como base uma entrevista de Milton Santos meses antes de sua morte, em janeiro de 2000, a Silvio Tendler, diretor de Jango, Josué de Castro Cidadão do Mundo, entre outros. O documentário foi vencedor pelo Júri Popular no Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, em 2006.
Em entrevista a Fórum, Silvio Tendler fala sobre a construção do documentário. Ele aponta ainda que, inspirado no geógrafo, considera que a resposta à concentração da comunicação está nos países periféricos e nos pobres de cada país.

FÓRUM- Como você conheceu o professor Milton Santos?

Silvio Tendler - Em 1995. Estava fazendo o filme; Josué de Castro, cidadão do mundo e discutindo fome e cidadania. A filha do Josué, a Ana Maria, falou que eu precisava entrevistar o Milton Santos, porque ele tinha acabado de ganhar o maior prêmio de geografia do mundo, o Prêmio Vautrin Lud. Fui à França, e consegui uma entrevista brilhante, e acabamos criando um vínculo. Em 1999, ele vinha ao Rio dar uma conferência sobre “Globalização Planetária”, Preparei para filmar a conferência. Quando soube que ele a tinha cancelado, por problemas de saúde, pensei: “é agora ou nunca”. Resolvi agendar uma entrevista. No começo de 2000, fizemos a entrevista. Ele estava um pouco doente, mas foi longa e maravilhosa. Serve como base do documentário Encontro com Milton Santos Ou: O Mundo Global Visto do Lado de Cá, mas também fará parte de um filme que estou fazendo chamado Utopia e Barbárie.

FÓRUM- No documentário, a opção é por intercalar falas de Milton Santos e imagens de acontecimentos recentes na América Latina, África e Oriente Médio. Por que?

Tendler - É a construção do diálogo. O documentário não é sobre o pensamento do Milton Santos é a construção de um diálogo entre eu e ele. Uma construção minha sobre palavras dele, sobre as quais fui buscando na realidade exemplos concretos do que ele falava. Milton Santos me propiciou ver o mundo com olhos que não via até o momento de conhecê-lo. Na entrevista, em 1995, o mundo estava em plena euforia da globalização, e ele me disse: “Isso não vai dar certo”. O motivo: “Porque não vai ter para todo mundo”. Eu classe média, engasguei na época e depois de um tempo entendi. Quando o entrevistei em 2000, ele faz um diagnóstico das coisas que estão acontecendo.

FÓRUM- Na entrevista, Milton Santos explica que a informação é o coração da globalização. Assim como o professor, o senhor acredita que a democratização da comunicação pode modificar os rumos do mundo?

Tendler - É o grande nó da questão. Hoje, temos mais ruído do que informação. Há uma grande concentração das empresas de comunicação em mãos de companhias mobilizadas pelo capital financeiro. Milton Santos acredita que a resposta a isso virá dos de baixo, daqueles que não tem compromisso com este sistema. Eu traduzo como: a resposta virá dos jovens com câmeras digitais que fazem rap, hip-hop etc. Em certo momento da entrevista, perguntei o que lhe dava tanta certeza de que aquilo que dizia iria repercutir. Ele olhou para câmera e disse: “Você”. Ele falou isso em 2000, hoje existem grupos que fazem cinema com uma câmera digital, gravam suas músicas nos computadores e distribuem pela internet. Tenho 57 anos, minha geração, que tentou mudar o mundo, é da classe média. É a geração, que resistiu ao golpe de 1964 com arte e cultura. Fui cevado nessa cultura, ouvindo “Opinião”, indo ao Teatro Oficina e assistindo os filmes do Cinema Novo. Atualmente, quem faz o movimento de contestação são os movimentos sociais, a periferia, não é mais a classe média. A resposta, como diz Milton Santos, virá dos países periféricos do mundo e dos pobres de cada país. A classe média não tem porque lutar além de manter seu status. Está prensada entre seu poder e o desejo de não despencar.

* por Brunna Rosa
Revista Fórum

http://blog.controversia.com.br/2007/08/15/tendler-e-as-respostas-de-milton-santos-a-globalizacao/

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